quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

Fééééééééériaaaaasssssss!!!


Depois de quase dez anos sem férias, este escriba resolveu, a partir desta sexta, 21 de dezembro do ano da graça de 2007, desligar os motores e ir pra Barra Seca*, adorar o sol e ajudar a aumentar o aquecimento global com uma churrasqueira ligada full-time.

Espero que as conversas aqui tenham sido úteis ou, pelo menos interessantes.

Volto ano que vem, depois do carnaval. Ou não.

Quem for brasileiro que me siga. Fui.



* Barra Seca é o paraíso: não pega celular, não tem internet, a única televisão de um boteco na beira da estrada empoeirada serve de pedestal pra um jarro de rosas artificiais, o mar está cheio de sereias, e peixes e camarões saltam da água nas mãos da gente... Energia elétrica, acho que tem...

sábado, 15 de dezembro de 2007

Sugestões para a Ísis, às portas do VestUfes

Ísis, para bem interpretar qualquer coisa, é necessário primeiro conhecer os termos dessa coisa. Ou seja, antes de tentar ver o que há nas entrelinhas é preciso ver o que há nas linhas. Vc vai se surpreender. Por exemplo, em "Os fetos, as begônias", as chaves interpretativas estão notítulo: fetos e begônias. Palavras têm vários sentidos, às vezes simultâneos. Nesse caso, begônias são, obviamente, flores e fetos tanto podem significar embriões quanto... samambaias. Aí já se estabelecem duas relações tendo como centro o personagem que leva os fetos e os coloca no subterrâneo: uma, que fala de enterrar embriões, o que dá ao conto certa aura de terror; outra que fala de colocar samambaias junto com begônias, como alguém que cria um jardim particular longe dos olhares da mulher (ela não sabe, está dito aí em algum lugar).

Parece-me que o autor (este escriba que escreve neste momento - 18h55 de sábado, 15 - atabalhoadamente, num cybercafé em Mantena, apenas para te dar mais coisas em que pensar), pareece que ele pretendeu falar das coisas que mantemos escondidas. Problemas ou mentiras, frustrações ou rancores, dores ou invejas, nossos pequenos e grandes crimes cotidianos, sempre que essas coisas são jogadas debaixo do tapete ou escondidas nos porões, sempre que não temos coragem de mantê-las à tona, de dizer o que queremos, de expressar nossos sentimentos, essas coisas se acumulam, formam um lixo tóxico e uma hora, quando vc se esquece delas, quando menos espera, elas saem do escuro em que estavam e , como samambaias e begônias, partem em direção à luz, num espetáculo de fototropismo para o qual, na maioria das vezes, não estamos preparados.

Tem mais coisas aí, Ísis, mas esse tempo do cybercafé está se esgotando (pasme, eles fecham às sete e já tem uma senhora quase me mandando embora), então, espero que algo aqui tenha sido útil.

Os fetos, as begônias

Os mortos vão bem, guardados na terra

Que os aquece e os mistérios lhes encerra.

— Paul Valéry


Não eram pó, ao pó não tornariam. Eram carne, sangue, sexo de seu sexo, mesmo assim, munidos que estavam de a-feições, divinos divididos filhos do falho útero de Deus. Eternally.

Foram recusados sete vezes e sete vezes sete seriam ainda expulsos do convívio com a Divindade, antes de apreenderem por experiência própria que não eram tantos, mas um, que se desdobrava, de forma que achou melhor conservá-los à parte uns dos outros para que não se reunissem de novo e não se multiplicassem, fazendo com que a noite desça sobre o mundo, e se rasgue o véu do tempo, e não se veja mais o dia.

O cheio acre a formaldeído, inundando o âmbito em que os deixava. Ficariam ali, no escuro, donos incontestes de seus quase gestos e de suas quase formas peculiares, transpirando seus desejos, ruminando suas limitações e seus ódios, mas cada qual à parte, patente em sua redoma de vidro e formol. Ele viria toda noite. Sabia acalantos vários e dispunha de notas suficientes para niná-los eternamente.

Eles não chorariam, tinha certeza, e não sentiriam fome, mas, até se sentissem, isso já estava previsto: comeriam os próprios estômagos, de maneira que o espaço que ocupavam não careceria jamais de amplidão, pois o que crescessem além do possível serviria para, amputado, alimentá-los. Eles concordariam.

A mulher não saberia de nada. Ela, além do mais, teria de compreender se soubesse. Mesmo porque, se fizessem tudo certo, não haveria pânico na vizinhança, nem explicações à polícia, nem jornalistas à porta. Nada poderia denunciar a existência dos fetos nos vidros de formol, porque suas raízes foram fixadas bem fundo. Os fetos não se incomodariam, certamente, de nunca mudarem de lugar. Melhor para eles, que permanecessem quietos nessa superfície escura do que se tivessem que disputar seu espaço na umidade do subsolo com as formigas e os escorpiões.

Pensando assim, ele cimentou a base dos vidros, para que vento algum os derrubasse (seria uma lástima ter embriões vagando pela casa, cobrando seu dasein, poderiam espantar as visitas) e se foi, fechando a porta, devagar, para não acordá-los, agora que descansavam.

E ele vinha, como prometera, todas as noites, por desencargo de consciência ou por amor. Até que, sem explicações, não veio mais. E todo movimento cessou.


Então, guiando-se por um raio de sol incrustado em algum lugar, eles se ergueram, todos juntos, romperam a entrada da vagina e irromperam no jardim, misturando-se, verdes, às begônias.

domingo, 9 de dezembro de 2007

D. asm / Alice e a redação no VestUfes

Aqui embaixo, no post Pink & Floyd, a sra. asm (ou Alice, ou Anônima), a (ex) tímida, escreveu:

"Eu gosto de escrever, gosto de algumas coisas q escrevo, mas tenho dificuldade de falar em público, e tb de escrever com alguma pressao: tempo, tema q eu nao domine, e o principal, saber que estao avaliando o texto, fazendo um julgamento. Tenho certeza q na prova vou deixar muito a desejar por causa desses fatores, tb pq gosto de escrever mais poemas, coisas + subjetivas.
O q vc acha q devo fazer nesse pouco tempo q tenho para amenizar esse problema, acho q muitas pessoas devem se sentir assim tb."

Então... eu acho que vc já tem um bom e um péssimo começo, simultaneamente. O bom, claro, é gostar de escrever. Isso já faz de vc alguém para quem uma caneta é algo tão natural quanto sentir sede. O lado péssimo é que, por medo, vc já começa derrotada ("Tenho certeza q na prova vou deixar muito a desejar"). Daí que, a primeira coisa a fazer é relaxar, acreditar em vc, ter confiança nas suas qualidades e entrar no jogo pra ganhar. As redações da Ufes não são meramente subjetivas (mas subjetividade ajuda muito): antes, exigem dos candidatos uma série de habilidades e conhecimentos objetivos. Nesse ponto, o melhor a fazer é treinar a escrita sob pressão (marque um tempo e pratique sozinha ou com a ajuda de alguém, para controlar a ansiedade) e, principalmente, ler, ler muito (que, aliás, é o que todos deveriam ter feito durante o ano): quem lê muito pode não escrever, mas quem não lê, com certeza não escreve — por falta de assunto.

Abre parênteses: meu filho, Frederico, teve aulas particulares com José Augusto Carvalho. Frederico era muito bom em gramática, sintaxe e ortografia. Um dia José Augusto me disse: "Seu filho escreve muito bem... sobre nada". Faltava conteúdo. A partir daí a gente intensificou as leituras dele e ele foi aprovado na UFMG. Fecha parênteses.

Leitura não é pesadelo de vestibulando. Enfiam isso na cabeça de vcs, mas é o contrário: ler é prazer diário. Na medida em que encontramos prazer no que fazemos, o que fazemos fiza bem melhor. A vcs, meninos e meninas da Ufes, aconselho que se habituem a ler pelo menos uma revista por semana. TODA SEMANA. O RESTO DA VIDA. Descontando os defeitos que todas têm, Veja, Época, Carta Capital, IstoÉ, são ótimas fontes de informação (quem souber inglês ou alemão pode tentar a Time e a Der Spiegel hehe). Além disso, o cuidado que dedicam à sintaxe, à gramática e à ortografia (sem contar o estilo de escrita) faz com que a gente aprenda essas coisas na prática, por osmose, sem ficar se estressando com todas aquelas nomenclaturas esquisitas. Das revistas em circulação por aí, a minha favorita é a Piauí, que aborda assuntos os mais díspares (de matéria com o vigia de um banheiro subterrâneo em Copacabana a uma discussão sobre a percepção da beleza — uma matéria fantástica com um dos maiores violinistas do mundo, Joshua Bell, tocando anônimo, com um Stradivari!, numa estação de metrô em Washington), de maneira inusitada e muito, muito, interessante.

Quando falo em leitura, falo em ler tudo que passar pela frente: anúncio de absorvente, placa de ônibus, bula de remédio... mas falo principalmente de livros, jornais e revistas. É com as idéias contidas neles que a gente alimenta a inteligência, a sensibilidade, o espírito. E é com isso que vcs farão a prova de redação (e outras) no VestUfes. O melhor, porém, é que, passado o vestibular, o que se leu permanece, faz parte de quem vc é.

Defendo a leitura de TODOS os livros que a Ufes indica: é uma oportunidade para que se conheçam muitas novas idéias (ainda que ninguém seja obrigado a concordar com elas). Não acreditem que não há tempo para a leitura e que a leitura é rodapé do vestibular. Talvez sejam poucas as perguntas na prova, mas as perguntas que vcs se farão ao longo da vida certamente se multiplicarão. E podem apostar: é muito mais importante fazer perguntas do que dar respostas (se ninguém tivesse perguntado "Que fungo é esse?", hj não teríamos a penicilina). Por isso, meninos e meninas, e em especial vc, d. asm/Alice/Anônima: NÃO LEIAM RESUMINHOS, a menos que já tenham lido os livros. Resuminhos são inúteis para o vestibular, depõem contra a inteligência de vcs, diz que vcs são preguiçosos e incapazes de entender o que lêem (o resuminho "entende" pra vcs) e só servem para que, nesse caso sim, vcs percam tempo.

Por falar nisso, então, resumindo: leitura é fundamental para uma boa prova de redação, livros e revistas e jornais (apesar das más notícias) dão prazer para o resto da vida (ao contrários dessses BBBs) e praticar a escrita diariamente é a melhor forma de se livrar do stress e do medo para a prova. Afinal: nós somos o que fazemos cotidianamente. A excelência é um hábito, não um acidente.

Boa sorte a todos nas discursivas (ah, jamais, mas jamais mesmo, deixem uma questão sem resposta: inventem, digam bobagem, mas não entreguem em branco. Melhor uma resposta tosca, nada-a-ver, do que uma em branco: essa é zero mesmo).

Bjs, d. asm-Alice-Anônima.